quarta-feira, 18 de novembro de 2009

A "face oculta" do nosso vocabulário


GLOSSÁRIO (II)

Assim se prova, quearte de furtar, e que esta seja ciência verdadeira, é muito mais fácil de provar, ainda que não tenha escola pública, nem Doutores graduados, que a ensinem em Universidades, como têm as outras ciências.”

Arte de Furtar” (1742)


Na falta de outra, temos «uma certa cultura de corrupção» segundo o ex-Procurador-geral da República, Cunha Rodrigues. E nesta área, afirmo eu, mantemo-nos no pelotão da frente e ninguém nos consegue despir a camisola amarela, rosa ou laranja, tanto faz.

Os mentores dos sacos azuis vivem numa área escura do poder de legalidade difusa; não sendo crime a escuridão, ninguém sabe, nem ou ouve o que se passa no interior dos sacos, quem põe, tira oudeixar ninguém deixa. Controlo democrático, nem pelo olfacto.

Saco” exprime “acto de saquear”, (ver Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa) tendo a vigiá-lo o “azulque também significa “polícia” (veja o Grande Dicionário da Língua Portuguesa) assimsaco azulnão é, mais nem menos, do que o “saque policiado” mas, não tenhamos a pretensão de vir algum dia a compreender os labirintos no interior de um saco azul que é, todos o sabemos, um saco sem fundo.


E o Glossário continua:


Dar a palmada ou dar o golpe circulam na gíria colorida do gingão e, claro que, deitar a luva ou deitar a unha não são expressões de salão, assim como depenar e depenador também não. Defraudador e defraudar são mais suaves no burlar. Porém, depredação e depredar são o roubo violento, muito diferentes do descaminho, um termo bonitinho, próximo do desvio e não longe do desfalque ou desfalcar, despojo ou despojar. Mas nobre, nobre mesmo, é o desvio…o desviar, não se utilizam abaixo do milhar e, creio que com a inflação, deviam ter sido promovidos a milhão. Dolo, até pela pronúncia tem classe e pavoneia-se pelos corredores do poder e dos tribunais.

Empochar, empalmar, empalmação andam muito pelas ruas do calão e eliminar, tal como endrominar, também. Empolgar é mais violento e o engodar tem ardil. Encobrir é guardar objectos de origem duvidosa; sinónimo de receptar. Esbrugar ou esburgar é ser forçado a dar dinheiro, a pagar uma soma avultada e esbulho e esbulhar são mais violentos e abrangentes indo até ao abuso de poder; escamotear é roubar com muita habilidade e escorchar anda pelos mesmos becos do despojar. Escroque, galicismo, entrou no nosso linguajar e ficou como burlão, intrujão, vigarista e trapaceiro que é. Ao esgueirar-se, subtrai-se com astúcia, desvia-se, sendo a estafa burla; espoliar é extorquir e esquivar-se furtar; enquanto que subtrair herança é expilar. Extorquir, extorsão e extorsionário são termos rudes; , extravio navega nas águas do desvio.

Fajardo furta habilmente, faz fajardice em suma; falcatrua e falsificar andam muito a par; a malta diz fanar, fazer a folha e fangueirada é furto que vale a pena. Fazer, fezada, fazer rajá é simplesmente roubar, mas fazer a pala é encobrir o roubo; e ainda com o verbo fazer temos o fazer mão baixa e fazer mão de gato. O flibusteiro vive de expedientes, da trapaça; forjar é falsificar; fraude ou fraudulência, fraudar, fraudador andam no campo do engano, do defraudar citado. Furto, furtar e furtança são linhas do mesmo novelo, onde se enrola a trapaça.


Razão para voltarmos com o “Glossário (III)

1 comentário:

Meg disse...

Cid,

Acabei de comentar longamente, tão longamente que, ao publicar apareceu-me a indicação de ERRO...
Não sei se o comentário entrou ou não.
Volto mais tarde...
Há poesia da boa "no pedaço"

Um abraço