sexta-feira, 26 de abril de 2013

A RUA

 “Se as fábricas fecham deixando os trabalhadores na rua é natural que na rua se manifestem”.
Já sabemos! Vota-se e se a miséria nos entra portas a dentro devemos manifestar-nos em casa frente à televisão, dar um tabefe no filho, chatear a mulher ou vice-versa. Na rua é que não!

Todas as medidas tomadas pelos governantes, mesmo se contrárias aos nossos interesses, estão de acordo com as leis vigentes, e porque promulgadas pelos nossos representantes, eleitos por sufrágio universal, devem também ser aceites democraticamente. Contestá-las na rua é que não! Ainda não chegámos ao Egipto.

Ora chiça! Exclamou a minha vizinha Carriça; qual a razão por que não posso dizer na rua o que desabafo frente à televisão e revoltar-me quando me tiram o pão?! Não; na rua é que não!

As marchas dos santos populares com arquinhos e muitos balões, folclore para turista ver, cantiguinhas que a populaça acompanha até é lindo. Bandeiras negras e vermelhas de contestação... na rua é que não!

Paradas militares com tambores e gaitinhas, canhões, tanques e o povo a bater palminhas e os senhores oficiais com fardas muito limpinhas, que no final arengam ladainhas, não esquecendo o senhor presidente circunspecto de postura imponente! Reclamar emprego na rua não é decente, dá dores de cabeça a muita gente. Que fique assente: na rua não!

“Não são permitidos ajuntamentos de mais de uma pessoa”; já ouvi isto em Lisboa. Na rua não se exige, pede-se, mendiga-se o que permite a muitas boas almas aliviar as pesadas consciências. A mão estendida enternece, o punho erguido é ameaçador, amedronta. Na rua não!

Se se querem manifestar, manifestem-se na Travessa do Fala Só, só; tem espaço limitado, cada qual pode falar com os seus botões, remorder os seus problemas sem alterar a ordem pública nem preocupar ninguém; têm como alternativa a Rua da Betesga. Outra rua é que não!

Mas chega o 1º de Maio que não cabe nas ruas; na Liberdade, avenida de multidões, torrente de cravos, abraços solidários, hinos à conquista de um futuro de bem-estar, esperança que não desvanece; em liberdade o primeiro de Maio acontece.

1º de Maio, avenida onde transbordam os sonhos que uma só rua não comporta; húmus onde os manifestantes retemperam as forças ou entusiasmos combalidos. O caminho tem sido íngreme e pedregoso, natural é o cansaço.

Não, rua não! Amplas avenidas a fervilharem de entusiasmo, de força, de amizade e confiança que nada nem ninguém derrubará; Alamedas, grandes espaços onde se respira a vontade colectiva de ser gente, sóbria, feliz, consequente.

Mais um primeiro de Maio em liberdade... robusto pilar da democracia.

1 comentário:

Olinda disse...

Era tao bom para o regime da alternancia,festejar o Primeiro de Maio,dentro de paredes.Aqui estâ uma coisa,que nunca,mas nunca,sucederâ!